Artigo de Opinião

Dr. Mário Frota, Presidente da apDC – Direito do Consumo, Coimbra

 

FACTURA DOS COMBUSTÍVEIS COISA “SEM ROQUE NEM REI”

COM TAXAS “IMPERCEPTÍVEIS”

ASSIM À MARGEM DA LEI?

“Olhei atentamente para a factura dos combustíveis e reparei que de cada vez que abasteço e pago com o cartão de crédito me aparece a cobrança de 52 cêntimos (mais de 100 escudos na moeda antiga), a título de comissão (de taxa do emissor).

‘Na parte final das facturas simplificadas dos combustíveis surge dissimuladamente:

COMPRA 28,30EUR   TX EMISSOR EUR 0

,52 (exactamente com esta configuração: o 0, na linha de cima e, na de baixo, 52.)

REDUNICRE INOVAÇÃO E CONFIANÇA PROCESSADO POR SIBS

E não há informação a tal respeito.

Será regular a cobrança? Se não for, haverá forma de reverter a situação?”

Cumpre emitir parecer:

  1. Os consumidores, com efeito, ao usarem como meio de pagamento os cartões de crédito VISA, sujeitam-se a um encargo de 52 cêntimos, independentemente do valor da factura: e nem sequer há a adição na factura do valor do combustível e da taxa assim imposta ao consumidor.
  2. Tal montante atingirá, no cômputo global, somas consideráveis, milionárias, como se calculará.
  3. E o que dispõe a lei a este propósito?

A menos que haja eventual excepção que não se descortina, um diploma legal de 5 de Janeiro de 2010 (o DL 3/2010) estabelece de forma inequívoca a proibição da cobrança de quaisquer encargos, como segue:

  • “pelas instituições de crédito nas operações, designadamente de levantamento, de depósito ou de pagamento de serviços, em caixas automáticas;
  • pelos beneficiários de serviços de pagamento nas operações de pagamento através dos terminais de pagamento automáticos.”
  1. “Às instituições de crédito é vedado cobrar quaisquer encargos directos pela realização de operações bancárias em caixas automáticas, designadamente de levantamento, de depósito ou de pagamento de serviços” (artigo 2.º)

“Ao beneficiário do serviço de pagamento é vedado exigir ao ordenante qualquer encargo pela utilização de um determinado instrumento de pagamento, para os efeitos do disposto na parte final da alínea b) do nº 6 do artigo 63.º do Decreto-Lei nº 317/2009, de 30 de Outubro [Decreto-Lei n.º 91/2018, de 12 de Novembro], que criou o regime jurídico que regula o acesso à actividade das instituições de pagamento e a prestação de serviços de pagamento.” (artigo 3.º)

  1. O que quer significar que as cobranças a este propósito efectuadas constituem um ilícito de mera ordenação social.
  2. E a moldura do ilícito, neste passo configurado, a que resulta do regime geral das contra-ordenações, a saber:
  • o montante mínimo da coima aplicável às pessoas singulares é de (euro) 3,74 e o máximo de (euro) 3 740,98.
  • o montante máximo da coima aplicável às pessoas colectivas é de (euro) 44 891,81.
  1. De estranhar é que isto passe efectivamente à margem de cada um e todos. E a prática se haja sedimentado sem eventual reacção das vítimas.
  2. É que de tostão em tostão se chega ao milhão
  3. O prejuízo singular, nos negócios massificantes, pode ser de montante reduzido. Mas em termos colectivos os montantes não serão nada desprezíveis. O enriquecimento injusto nessa medida pode representar milhões…
  4. Cumpre ao Banco de Portugal pronunciar-se a tal propósito, agindo como mandam as circunstâncias.