Artigo de Opinião

Dr. Mário Frota, Presidente da apDC – Direito do Consumo, Coimbra

 

OS CONTRATOS FORA DE ESTABELECIMENTO

Direito de os Consumidores

DELES SE DESFAZEREM

 

Os contratos fora de estabelecimento não se esgotam nos exemplos comezinhos em que as vendas se processam exclusivamente ao domicílio ou porta-a-porta.

Por “contratos fora de estabelecimento” se entende, no denominado Espaço Económico Europeu (Os Estados da União Europeia a que acrescem três outros Estados aderentes), um vasto leque de contratos, para além dos celebrados no domicílio do consumidor, a saber, os:

  • Celebrados no estabelecimento comercial do fornecedor ou através de quaisquer meios de comunicação à distância imediatamente após o consumidor ter sido, pessoal e individualmente, adrede contactado em local que não seja o do estabelecimento comercial do fornecedor respectivo (contratos por apelo ou chamamento);
  • Celebrados no local de trabalho do consumidor (contratos ocasionais ou como tal expressamente organizados) ;
  • Celebrados em reuniões em que a oferta de bens ou de serviços seja promovida por demonstração perante um grupo de pessoas reunidas no domicílio de uma delas, a pedido do fornecedor ou do seu representante ou mandatário (contratos ‘tupperware’);
  • Celebrados durante uma deslocação organizada pelo fornecedor de bens ou por seu representante ou mandatário, fora do respectivo estabelecimento comercial (contratos em excursões adrede organizadas);
  • Celebrados no local indicado pelo fornecedor de bens, a que o consumidor se desloque, por sua conta e risco, na sequência de uma comunicação comercial feita pelo fornecedor de bens ou pelo seu representante ou mandatário (contratos-isco).

Nestes contratos, os consumidores dispõem, por lei, de 14 dias para dar o dito por não dito. Não são contratos firmes. Estão sujeitos a um período de reflexão ou ponderação dentro do qual os consumidores podem retractar-se, ou seja, “dar o dito por não dito”, desfazendo-os de todo e sendo reembolsados do preço pago.

Importa, porém, consignar neste passo uma nota: se das cláusulas do contrato não constar nem o direito de se “dar o dito por não dito” nem se anexar um formulário para o efeito, esse direito – o de desistência – no prazo de 14 dias, alonga-se por mais 12 meses, o que quer dizer que o consumidor, tem, para além dos 14 dias iniciais, mais 12 meses para pôr termo ao contrato.

A partir de 28 de Maio de 2022, no entanto, passa a haver novas regras em duas situações precisas, de harmonia com um diploma legal que saiu a 10 de Dezembro ainda em curso.

O consumidor tem o direito de desistir do contrato, não no prazo de 14, mas no de 30 dias,  desde que celebrado

  • no domicílio do consumidor;
  • durante uma deslocação organizada pelo fornecedor, fora do respectivo estabelecimento comercial.

 

Não há, porém, direito de pôr termo a ao contrato, salvo acordo das partes em contrário, em determinadas hipóteses de que se enunciam algumas:

  • Fornecimento de bens confeccionados de acordo com especificações do consumidor ou manifestamente personalizados;
  • Fornecimento de bens que, por natureza, não possam ser reenviados ou sejam susceptíveis de se deteriorar ou de ficar rapidamente fora de prazo;
  • Fornecimento de bens selados não susceptíveis de devolução, por motivos de protecção da saúde ou de higiene quando abertos após a entrega;
  • Fornecimento de gravações áudio ou vídeo seladas ou de programas informáticos selados, a que o consumidor tenha retirado o selo de garantia de inviolabilidade após a entrega;
  • Fornecimento de um jornal, periódico ou revista, com excepção dos contratos de assinatura para o envio de tais publicações;
  • Fornecimento de alojamento, para fins não residenciais, transporte de bens, serviços de aluguer de automóveis, restauração ou serviços relacionados com actividades de lazer se o contrato previr uma data ou período de execução específico…

 

Por conseguinte, não são só contratos fora de estabelecimento comercial os celebrados “porta-a-porta” (no domicílio do consumidor). Com a prerrogativa de desistência ou retractação após o necessário período de reflexão ou ponderação (de 14 ou 30 dias, consoante os casos, como se assinalou).