Artigo de Opinião

Dr. Mário Frota, Presidente emérito da apDC – Direito do Consumo, Coimbra

 

TORPE TRANSMISSÃO DE ‘DÍVIDAS’, SOEZ CEDÊNCIA DE DADOS, DEIXA AS VÍTIMAS LÍVIDAS E OS MAIS ‘ABANANADOS’

Das Condições Gerais do Contrato da MEO / ALTICE:

“A Altice Portugal, no âmbito da sua actividade, poderá recorrer a terceiros para a prestação de determinados serviços. Por vezes, a prestação destes serviços implica o acesso, por estas entidades, a dados pessoais dos Clientes/Utilizadores.

Assim, qualquer entidade subcontratada pela Altice Portugal tratará os dados pessoais dos nossos Clientes/Utilizadores, em nome e por conta da Altice Portugal e adoptando medidas técnicas e organizacionais necessárias de forma a proteger os dados pessoais contra a destruição, acidental ou ilícita, a perda acidental, a alteração, a difusão ou o acesso não autorizado e contra qualquer outra forma de tratamento ilícito.”

  1. Não se tem por lícita a transmissão de dívidas da MEO ou de qualquer outra empresa que contenha nos seus contratos de adesão cláusulas genéricas como as transcritas.
  2. Tal viola a Lei das Condições Gerais dos Contratos – O DL 446/85, de 25 de Outubro – que, na alínea l) do seu artigo 18, estabelece o seguinte:

Cláusulas absolutamente proibidas

“São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:

Consagrem, a favor de quem as predisponha, a possibilidade de cessão da posição contratual, de transmissão de dívidas ou de subcontratar, sem o acordo da contraparte, salvo se a identidade do terceiro constar do contrato inicial.”

  1. Ponto é que a MEO especifique de modo rigoroso, nos seus contratos, a entidade a que transmite a dívida, em se tratando de dívidas judicialmente exigíveis ou montantes inexigíveis por acção ou injunção que por negligência própria não cobrou no tempo e no lugar próprios..
  2. Desde 28 de Maio p.º p.º que tais cláusulas apostas nos contratos singulares – e que persistem nos documentos de antanho que vinculam a predisponente MEO – constituem um ilícito de mera ordenação social, de harmonia com a Lei das Condições Gerais dos Contratos: artigo 34 – A.
  3. É de contra-ordenação muito grave que se trata passível de coima, cujo leque oscila entre os 24 000,00 e os 90 000,00 €, se o infractor for uma grande empresa, como é o caso.
  4. Por outro lado, a emissão de comunicações não solicitadas, porque não legitimada para o efeito, pela INTRUM [quer se apresente como cobrador de fraque ou em trajos andrajosos, tanto vale], constitui também um ilícito contra-ordenacional, tratando-se de pessoas singulares: Lei 41/2004, de 18 de Agosto – artigo 13-A:
  5. “1 – Está sujeito a consentimento prévio e expresso do assinante que seja pessoa singular, ou do utilizador, o envio de comunicações não solicitadas para fins de marketing directo, designadamente através da utilização de sistemas automatizados de chamada e comunicação que não dependam da intervenção humana (aparelhos de chamada automática), de aparelhos de telecópia ou de correio electrónico, incluindo SMS (serviços de mensagens curtas), EMS (serviços de mensagens melhoradas) MMS (serviços de mensagem multimédia) e outros tipos de aplicações similares.
  6. As coimas na circunstância aplicáveis oscilam entre os 5 000 e os 5 000 000 € – Lei 41/2004, de 18 de Agosto – artigo 14.~]
  7. Já sem falar do assédio que uma tal prática agressiva reiterada também constitui [DL 57/2008: alínea c) do art.º 12, cominando-se a infracção como grave e, tratando-se de grande empresa, com coimas cuja moldura vai dos 12 000,00 aos 24 000,00 €.
  8. Para além, obviamente da cedência de dados pessoais não consentida, em violação do art.º 6.º Regulamento Geral de Protecção de Dados, o que constitui contra-ordenação muito grave cuja coima oscila entre  os 000 e os 20 000 000 ou 4 % do volume de negócios anual, a nível mundial, conforme o que for mais elevado, tratando-se de grande empresa: Lei 58/2019 – alínea a) do n.º 2 do art.º 37.

EM CONCLUSÃO

a. Não há transmissão de dívidas sem prévia aquiescência do consumidor: DL 446/85 – alínea l) do art.º 18.

b. A operar-se uma tal transmissão ilícita, a coima aplicável, no caso, orça entre os 24 000 e os 90 000 €.

c. As sucessivas abordagens ao consumidor, sem para tanto estar a empresa legitimada, pelo recurso a comunicações não solicitadas, representa também um ilícito de mera ordenação social passível de coima de 5.000 a 5 000 000 €: Lei 41/2004 – art,ºs 13-A e 14.

d. A que acresce o assédio, como prática agressiva, que redunda em coima, em se tratando de grande empresa, cuja moldura é de 12 000 a 24 000 €: DL 57/2008: alínea c) do art.º 12 e n.º 1 do art.º 21.

e. A transmissão de dados sem o consentimento do titular é vedada [RGPD: art.º 6.º]: ilícito de mera ordenação social passível de coima de 5.000 a 20 000 000, com alternativa – Lei 58/2019 – al. a) do n.º 2 do artigo 37.