Artigo de Opinião
Dr. Mário Frota, Presidente emérito da apDC – Direito do Consumo, Coimbra
ECONOMIA CIRCULAR
“DIREITO À REPARAÇÃO”: UM “NOVO” DIREITO?
OU UMA ‘MISTIFICAÇÃO’ A PRECEITO?
“É usar e deitar fora”?
Ou importa contrariar esta tendência que nos arruína os recursos?
De acordo com os estudos do European Environmental Bureau, o tempo de vida útil de um smartphone, a título de exemplo, para que se possa considerar em relativo equilíbrio e correspondência com os ciclos naturais e humanos de reposição de recursos, deveria situar-se entre os 25 e os 232 anos (enorme o leque…).
Actualmente, o tempo de vida útil de um smartphone é de 3 anos.
Os custos ambientais e económicos desta enorme discrepância são gigantescos e incomportáveis.
De acordo com os estudos realizados, a aprovação de regras que estendessem a longevidade – apenas de alguns dos dispositivos – representaria, em 5 anos, no EEE – Espaço da Económico Europeu,
– a diminuição de 12 milhões de toneladas anuais de equivalente-CO2, o que
– equivaleria a retirar de circulação 15 milhões de veículos movidos a combustíveis fósseis…
Um direito de reparação, fora do quadro da garantia legal e ou comercial, de molde a prolongar a vida dos produtos?
Para fazer renascer ofícios e mestres que entretanto se extinguiram… porque sempre mais fácil substituir que reparar?
E para assegurar formação adequada a que despontem novas fornadas de “reparadores” com um “saber-fazer” irreparável?
Para reparar… de modo a que seja mais em conta que substituir?
Ou será que o reparar será sempre mais caro pelo valor da mão-de-obra, dependendo obviamente da categoria dos produtos?
Trata-se, na realidade, de uma autêntica revolução o que ora se esboça.
Será que a inversão do paradigma não constituirá obstáculo à inovação & desenvolvimento?
Não haverá que curar de um equilíbrio ponderado de molde a evitar que o progresso se estanque?
Exercício que demandará decerto muito “engenho & arte” e se não solucionará de uma penada só…
Ou será que a evolução de novos modelos inteiramente recicláveis (e de acesso universal, ao alcance de qualquer bolsa…) não configurará o cenário preferível?
O mote para o debate está dado.
Importante é que esquadrinhemos todos os aspectos, envolvendo na discussão todos os partícipes [indústria, serviços, distribuição e pontos de venda (as associações de interesse económico), os consumidores, as Universidades, os Centros Tecnológicos & de Investigação…] para que as soluções mais adequadas se logrem e se imponham no interesse geral.
O Parlamento Europeu, com efeito, por Resolução de 25 de Novembro pretérito, sob o lema
“rumo a um Mercado Único mais sustentável para empresas e consumidores”,
confere particular relevo ao Direito à Reparação dos Produtos” (intentando gizar uma estratégia fulcral em matéria de REPARAÇÃO de BENS DE CONSUMO).
Dirigiu, por conseguinte, à Comissão Europeia um sem-número de recomendações que visam, com efeito, dar forma a um MERCADO INTERIOR SUSTENTÁVEL, como convém e constitui imperativo indeclinável de qualquer política europeia ou global de consumidores nos tempos que correm.
E enumera um amplo leque de medidas que há que trasladar em forma de lei e se compendiam como segue:
· A outorga de um «direito de reparação» aos consumidores
· A promoção da reparação em vez da substituição
· A normalização das peças sobresselentes que promova a interoperabilidade e a inovação
· O acesso gratuito às informações necessárias para a reparação e a manutenção
· Um cacharolete de informações que os produtores terão de facultar sobre a disponibilidade de peças sobresselentes, actualizações de «software» e a possibilidade de reparação de um produto, nomeadamente acerca de:
o período estimado de disponibilidade a partir da data da compra,
o preço médio das peças sobresselentes no momento da compra,
o prazos aproximados recomendados de entrega e reparação
o e informações sobre os serviços de reparação e manutenção
· O período mínimo obrigatório para o fornecimento de peças sobresselentes em consonância com a duração de vida estimada do produto após a colocação no mercado da última unidade
· A garantia de preço razoável para as peças sobresselentes
· A garantia legal para as peças substituídas por um reparador profissional quando os produtos já não estiverem cobertos pela garantia legal ou comercial
· A criação de incentivos, como o «bónus do artesão», susceptíveis de promover as reparações, em particular após o fim da garantia legal.
Ao ritmo a que se as coisas se processam, em 2050, consumiremos o triplo do que o Planeta Terra nos oferece: algo como se houvesse três Terras, quando só uma existe!
“Dar mais vida aos produtos para que a vida se prolongue”: deverá ser o lema desta estratégia convertida em nova política de consumidores!
“Dar mais vida aos bens para que se dê mais vida à vida”
A seguir o debate que não pode tardar!
De molde a que cada um possa participar interessadamente nele!