Artigo de Opinião

Dr. Mário Frota, Presidente emérito da apDC – Direito do Consumo, Coimbra

 

CONTRATAÇÕES POR TELEFONE, ‘INTERPELAÇÕES’ À VODAFONE

 

“Contrato de comunicações electrónicas de uma associação sem fins lucrativos que chega ao fim: serviços satisfatórios, os da Vodafone, renovação assegurada.

Um telefonema da empresa e a renovação, diz-se, fez-se sem mais. De modo simples. Pelo telefone. Retiram equipamentos e aplicam novos.

A partir de então, a internet passou do 80 ao 8, sem permitir se assegurasse minimamente o trabalho diário da instituição.

Técnico vem, técnico vai e… “o 0 (zero) absoluto”!

A associação diz que quer acabar com o contrato, recorrendo a outro operador.

Da Vodafone – perante o facto – a ameaça de que vai para tribunal exigir o resto da fidelização, que fica por cumprir.

Será assim? Se a empresa não cumpre, terá o cliente de suportar o péssimo serviço até ao termo do contrato?”

Ante a factualidade apresentada, as ponderações que seguem:

1. As regras aplicáveis à celebração dos contratos, ainda que com associações sem fins lucrativos, micro e pequenas empresas, são as que

resultam dos n.ºs 1, 2 e 6 do artigo 120 da Nova LCE – Lei das Comunicações Electrónicas.

 

1.1. O n.º 1 preceitua:

“As empresas … devem, previamente à celebração do contrato, facultar ao cliente as informações constantes da Lei dos Contratos à Distância de 2014 (art.º 4.º) e da Lei de Defesa do Consumidor de 1996 (art.º 8.º), consoante o modo de celebração: se à distância, se presencialmente.

1.2. E o n.º 2:

“As empresas … facultam ainda ao cliente, no mesmo momento, de forma clara e compreensível, em suporte duradouro, as informações constantes de um anexo [o III] à presente lei …

1.3. E o n.º 6:

“As empresas … facultam aos clientes, em suporte duradouro, um resumo do contrato, conciso e facilmente legível, que identifica os principais … requisitos de informação…”, com um padrão mínimo expressamente enunciado.

2. Nada disto se observou. Logo, o contrato é nulo: não tem qualquer validade. Por força do Código Civil: art.ºs 220 e 294.

 

3. E, ainda que fosse válido (e não é…), eis o que se diz quanto ao cumprimento defeituoso e ao incumprimento por parte da empresa [LCE: alínea d) do n.º 2 do artigo 113]:

“Os clientes têm o direito de [pôr termo ao contrato] sem custos em caso de discrepância significativa, continuada ou recorrente, entre o desempenho real dos serviços e o desempenho indicado no contrato, nos termos do artigo 130.º;

3.1. E o artigo 130, sob a epígrafe “incumprimento dos níveis de desempenho do serviço”, reza o seguinte:

“Qualquer discrepância significativa … é considerada como sendo base para o desencadeamento …, nomeadamente, da prerrogativa de [pôr termo a]o contrato sem qualquer custo.

3.2. E, no artigo 138 (“resolução de contratos por iniciativa do utilizador final”), se preceitua:

“1 – Sempre que, … o cliente tenha o direito de [pôr termo a] um contrato de comunicações electrónicas antes do termo … da fidelização, não lhe pode ser exigido o pagamento de quaisquer encargos [pela] cessação antecipada do contrato, excepto no casos em que pretenda conservar um equipamento terminal subsidiado.

2 – Se … optar por conservar o equipamento terminal…, qualquer compensação devida não pode exceder os limites impostos [pela lei]…”

4. Logo, nos termos gerais de direito e no quadro da LCE, o cumprimento defeituoso do contrato ou o seu incumprimento pela empresa é susceptível de constituir fundamento para a ruptura do contrato com justa causa. Sem onerar obviamente o cliente lesado.

 

5. Por conseguinte, ao contrário do que veiculam as telefonistas da Vodafone e suas concorrentes, o serviço deficiente, a ausência de qualidade, o incumprimento, em suma, do contrato de comunicações electrónicas leva à sua extinção por resolução sem que, por regra, seja exigida qualquer compensação ou indemnização ao utilizador final.

 

6. Em conclusão, o que se recomenda vivamente às VODAFONES e quejandas é que dêem formação ao seu pessoal para que não ande por aí a ‘vomitar enormidades’ e a constranger quem ignora os seus direitos, mas reclama justiça para as dificuldades com que se confronta no dia-a-dia.

 

Eis o que se nos oferece perante a situação de facto reclamada.